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Fernando Távora "Longos dias têm cem anos"

26/06/2023

Há precisamente 30 anos (1993), ainda eu não imaginava que me iria deslumbrar pelo mundo da arquitectura, inaugurava em Lisboa, mais precisamente no Centro Cultural de Belém uma exposição monográfica em torno da vida e obra de Fernando Távora. Teria desejado participar nesse singular momento, com a propriedade e interesse de hoje, na consciência do significado e da importância que a obra de Fernando Távora tem no panorama da arquitectura e cultura portuguesa no séc.XX.

 

A exposição intitulada “Percurso” presenteava-nos a abertura com um terno e expressivo manifesto, um Távora de braços estendidos onde afirmava: “Quereríamos que esta exposição fosse entendida como um apelo à Vida, como uma manifestação de esperança no destino do homem e como uma apaixonada afirmação do significado profundo da Arquitectura.” Fernando Távora e a sua equipa, resumiam os seus 70 anos de vida numa exposição construída em torno dos seus objectos pessoais, das suas memórias, dos seus livros, dos seus desenhos e de 22 projectos de arquitectura. Os possíveis de expor, entre muitos. Um marco que merecia ser repetido possibilitando aos mais jovens, hoje, saborear o traço do mestre com um outro olhar para além do écran do ipad.

 

Recentemente, a propósito do lançamento do Mapa da Arquitectura de Fernando Távora, a Fundação Marques da Silva, generosamente, disponibilizou um vídeo sobre a inauguração da referida exposição. Curiosamente Fernando Távora confessava o desejo de que dali a 70 anos (em 2063) se realizasse uma nova exposição sobre os 70 anos seguintes àquele data. Alicerçando a ideia de que por essa altura, ainda estaria vivo e o dia da inauguração, dessa segunda exposição, seria o revisitar das “recordações, realidades e sonhos, o passado e o futuro, factos, lugares, imagens, ideias e formas, gentes, viagens e leituras, assim se construindo a vida e obra de um homem e de um arquitecto”. Exposição que a acontecer em 2063, será com certeza um momento importante de reflexão histórica e de efectivo entendimento de uma geração charneira que fundou a “Escola do Porto” e percorreu os caminhos do movimento moderno em Portugal. Estando 2063 ainda longe, no actual ano de centenário do nascimento de Fernando Távora (1923-2005), será incontornável celebrar a obra de um dos maiores vultos da Arquitectura contemporânea Portuguesa. Que entre poucos, soube interpretar a arquitectura moderna internacional e “ajusta-la” ao contexto da arquitectura tradicional portuguesa. Apesar da importância desta irrepetível ocasião, e já decorrido metade do ano, são poucas as iniciativas de homenagem a Távora. Para além da visita guiada do arquitecto João Paulo Rapagão e do historiador Joel Cleto ocorrida logo no início do ano ou o Curso Breve “Arquitecto Fernando Távora: consagrar a vida à verdade” pelo arquitecto Luís Aguiar Branco a decorrer no mês de Maio no Auditório da Biblioteca Almeida Garrett no Porto, não se vislumbram mais iniciativas nos próximos meses. Confesso que esperava um 2023 intenso na revisitação da obra e vida de Fernando Távora, não só pelas razões já referidas, mas sobretudo por entender que as gerações mais novas desejam descobrir a obra de alguém que viveu a disciplina tão intensamente e foi incontornável na definição dos caminhos do movimento moderno por terras lusitanas. A escassez de iniciativas até à data é notória, contudo espero ser surpreendido por uma grande exposição recapitulativa de centenário à imagem da exposição de 1993.

 

Sabendo do pouco tempo que nos resta, aguardo com expectativa as iniciativas que as entidades responsáveis pela promoção e valorização da arquitectura poderão estar a preparar no sentido de dignificar a obra do consagrado arquitecto em ano de centenário do seu nascimento. Espero não estarmos perante o desperdiçar de uma oportunidade única de justamente fazer história, tal como Agustina Bessa-Luís definia no seu “longos dias têm cem anos”, “E os longos dias passavam, carregados de justo sentimento pelas coisas que devíamos fazer de maneira lesta e durável. Às vezes, não se faziam nunca.”

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