REBENTA A BOLHA
26/03/2020
No nosso tempo de miúdos, sempre que alguém fazia batota ou não cumpria as regras do jogo das escondidas, gritava-se “rebenta a bolha”. Tal grito permitia parar o decurso do jogo, restituir a ordem através da reunião dos participantes, retomando o jogo com todos novamente em pé de igualdade. A pandemia do Covid-19 acabará por ser, em certa medida, esse grito de restituição da normalidade! Sem certezas de nada e de quanto tempo perdurará este flagelo, será sempre ingrata a premonição contudo os sinais poderão ser lidos!
No passado recente, o abanão do sub prime em 2008 obrigou o governo a redesenhar um conjunto de políticas por forma a garantir o mais rapidamente a estabilidade dos mercados mais afectados, inclusive o imobiliário. A manutenção dessas politicas permitiu o desenvolvimento do país de forma generalizada mas sustentada, operando-se uma recuperação interessante e mais tarde parabenizada por todos os países parceiros europeus.
À falta de financiamento por parte da banca, os benefícios fiscais permitiram a entrada de dinheiro estrangeiro no sector, operando o desenvolvimento e rejuvenescimento dos centros das cidades. Paralelamente, o Decreto-lei nº 53/2014, que serviu para alavancar o sector da construção através da promoção de um regime excepcional e temporário na difícil e desarticulada regulamentação existente, apesar da aceleração da construção, provocou consequentes processos sem controlo na reabilitação do edificado. Se os vistos gold permitiram o arranque do imobiliário nos sectores prime, foi o turismo generalizado e em massa que permitiu o desenvolvimento de forma directa ou indirecta de todas actividades que de si beneficiam e em particular o mercado imobiliário.
Esta onda da recuperação, também ela resultado das acções de charme operadas pelos governos da altura no estrangeiro, proporcionou a cidades como Lisboa e Porto assim como Portugal de forma generalizada tornarem-se “marcas” e lugares apetecíveis para um turismo que olhava a velha Europa enquanto território démodé. Este encanto permitiu a explosão de uma dinâmica muito interessante, contudo rápida de mais para todos se adaptarem. Na última década, nenhuma capital europeia que tenha sofrido deste “boom” turístico teve decrescimento ao nível do número de dormidas, exceptuando Londres em 2018. Lisboa território privilegiado da especulação imobiliária, com um crescimento ao nível das dormidas na ordem do 10% ano muito acima das percentagens nacionais, será dos territórios mais fustigados por este fenómeno do Covid-19.
Os novos agentes do sector do turismo, numa mão cheia de anos, abraçaram a actividade numa lógica de fuga para a frente, encontrando na oportunidade apenas o lucro sem perceberem a globalidade e constrangimentos do sector. A consequente diminuição dos movimentos do turismo irá revelar a inconsistência de várias áreas de um sector que se reinventou na base de um Airbnb liderado por pequenos particulares e sem experiência. Esta estrutura organizacional de alojamento, que na maioria dos casos vive dos subarrendamentos irá, em parte, esvaziar-se colocando rapidamente no mercado milhares de imóveis para arrendamentos. Será aqui que os proprietários perceberão as virtudes dos arrendamentos de longa duração, preferindo rendas ajustadas mas com fiabilidade e futuro nas garantias de estabilidade da sua rentabilidade. Um cenário que alguns não acreditavam que poderia acontecer... Mas aconteceu! Rebenta a bolha!